Quando o parto de “Madalena - O
tradicional Casamento sem amor” aconteceu, deixou de pertencer ao autor HOSTEN
YASSINE ALI, sendo carinhosamente acariciado pelos seus leitores cúmplices. Depois de conquistar muitos destes
leitores em Portugal, eis que me surge finalmente nas mãos fresquinho, kanimambo
vida que o trouxe aos meus sentidos… depois de encontros, desencontros e
reencontros com o autor. Obviamente, uma grande surpresa, como de resto o
próprio autor. Bons olhos o vejam!
Um jovem oficial da marinha
moçambicana em Portugal, em formação superior, habituado a disciplina reclusiva
e rigor, propícia ao Escritor em potência que já morava nele, foi reflectindo
em torno de questões fundamentais da sociedade moçambicana e da nossa
existência. Um olhar microscópico sobre realidades já conhecidas nalguns casos,
mas não debatidas e eventualmente desconhecidas para outros.
Períodos longos que permitiram ao
Autor um longo namoro com a escrita de que resultou este belo livro,
magistralmente escrito.
O jovem Escritor Moçambicano, um
Cronista de excelência e um grande romancista em potência, surpreendem pela
maturidade na escrita, pelas escolhas que fez enquanto “iniciante” na
literatura e pela enorme qualidade e valor estético-literário da sua obra (“Kurhula”
crónicas e “Madalena- O tradicional casamento sem amor” Romance). Escolha
arriscada , mas pensada. Calculo.
As tradições aqui desnudadas,
muitas vezes incompreendidas são um apelo ao seu conhecimento, compreensão e
descodificação.
A identidade de qualquer povo
está alicerçada na língua e num sistema
de valores e tradições mais ou menos contestados, sobretudo quando se sofrem
500 anos de colonização e um combate cego, feroz e desigual (ao tribalismo,
regionalismo, obscurantismo), desde 1975, e que se prolongou num longo período
pós-independência até 1986, terminando sem vencedores nem vencidos.
Não se combatem as tradições com
decretos lei. Mas, qualquer tradição pode conter nela códigos e práticas
nocivas ou até carregadas de violações de direitos fundamentais e genericamente
atropelos graves à dignidade humana para as sociedades modernas, em especial
para as mulheres da sociedade moçambicana actual, no actual estágio de
desenvolvimento. Mas, por outro lado, podem conter códigos que beneficiam
franjas de cidadãos fragilizados pela sua condição, particularmente as mulheres
em determinados contextos.
Nesse sentido, o Autor
interpela-nos e motiva-nos à reflexão profunda sobre uma realidade que existe e
que não pode jamais ser ignorada.
Cabe-nos a nós leitores, fazer a
escolha subjectiva entre o que é nocivo e o que é benéfico, contribuindo se
possível para o debate e para a eliminação, se necessário, de práticas nocivas
ou não, que efectivamente podem prejudicar mais do que beneficiar globalmente a
sociedade moçambicana, num diálogo sábio e permanente com as tradições.
DELMAR MAIA GONÇALVES
(PRESIDENTE DO CÍRCULO DE
ESCRITORES MOÇAMBICANOS NA DIÁSPORA – CEMD)
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